Artes e Letras
Pe António Vieira
(1608-1697)
4º Centenário do NascimentoNascido em Lisboa, em 1608, de família modesta, contava António Vieira seis anos quando o levaram para a Baía, onde seu pai desempenhava um cargo de estado.
No colégio jesuíta desta cidade estuda e torna-se homem extremamente culto.
Apesar dos votos religiosos, o Padre António Vieira é criatura que, amando a vida em sociedade, se mostra continuamente ávido de acção e sedento de participar nos negócios do Estado.
Em 1641 parte com D, Fernando de Mascarenhas para Lisboa, o qual vinha ao reino afirmar a D. João IV a adesão dos colonos brasileiros à causa da independência nacional. Na capital encanta logo o soberano a tal ponto com a vivacidade do seu espírito e o sortilégio da sua palavra rica e hábil, que, logo em 1642, o Padre António Vieira prega na capela real dos Paços da Ribeira e vem a ser nomeado pregador de Sua Majestade.
Os seus Sermões despertam tão grande entusiasmo que a sua popularidade cresce ao ponto de os lugares na capela de S. Roque terem de ser marcados com antecedência1.
D. João IV encarrega-o de várias missões diplomáticas. Vivendo de sonhos no meio de realidades, encontrava-se destinado a falhar — em parte devido às suas ilusões do mundo; em parte devido às extravagâncias de alguns dos seus projectos, que, elaborados de acordo com as melhores intenções, vão, no entanto, de encontro à consciência nacional.
Em 1647 empreende uma viagem a Paris onde devia negociar o casamento de D. Teodósio, o herdeiro do trono português, com uma prima de Luís XIV.
Em Haia e em Itália onde, em seguida estanciou, também não foram coroadas de êxito as suas negociações diplomáticas, o que naturalmente o prejudicou como político na opinião de D. João IV, sem que por isso o homem ou o pregador tivessem sido diminuídos.
Como a opinião pública se mostrava hostil aos seus planos políticos, António Vieira regressa ao Brasil, onde novos desgostos e trabalhos o aguardam.
A viagem é tormentosa: atacada a nau, os corsários abandonam-no na ilha Graciosa.
Sem quebrar o ânimo, fulmina do púlpito, ainda com mais ardor, os erros da governação ultramarina e a apatia dos que, vivendo sossegadamente na metrópole, deixam correr as coisas à mercê da aventura.
De regresso ao Brasil, leva ordens para libertar os índios da escravidão, acabando por cair prisioneiro dos colonos revoltados.
Quando volta a Portugal já não encontra em D. Afonso VI a amizade e o valimento que tinha junto de D. João IV. Refugia-se no sonho, escrevendo a História do Futuro, em que prometia um quinto império aos Portugueses, e as Esperanças de Portugal, quando o Santo Ofício o priva de pregar e o condena a viver recluso em qualquer cada dos Jesuítas.
Com D. Pedro IV Vieira torna a encontrar um pouco do seu ascendente na corte e em 1669 parte para Itália, onde deslumbra a gente culta com a sua eloquência, ao ponto da rainha Cristina da Suécia o pretender para seu confessor particular.
Anulado o processo que lhe havia movido a Inquisição, escreve novo trabalho de visionário — a Clavis Prophetarum — e regressa à pátria mas, desesperando de ver reabilitados entre os judeus, pelos quais se batera, volta ao Brasil, onde vem a falecer com perto de noventa anos de idade.
I. Teixeira de Aguilar
1 Deixando de lado as obras menores do Padre António Vieira, merece atenção as produções literárias a que deveu a sua celebridade: os Sermões e as Cartas. Os primeiros têm matéria tanto religiosa como política. O espírito livre de Vieira não podia deixá-lo indiferente às grandes questões políticas nacionais e da diplomacia da Europa do seu tempo. No Verão de 1669 embarca para Roma. Frequenta o Palácio Riário onde se reuniam as mais ilustres figuras da cultura da época. A Rainha Cristina da Suécia, exilada em Roma, convida-o em 1673 para seu pregador oficial. O excessivo apego ao conteúdo teológico da obra de António Vieira impede quem o lê de ver mais fundo. Importa, por isso, fazer uma releitura da obra de António Vieira porque, o que ele escreve, assinala e reflecte, não deixa de ser, em grande parte, uma forma inferir, de prospectar o oculto, silenciando através da sonoridade cantante da palavra escrita o que a voz não podia pronunciar com clareza (N.da R.).
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